quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Sobre a paciência e o fim dela

Eu tenho uma relação no mínimo complicada com meu avô.
Ele se separou da minha vó no ano em que eu nasci, mas continuou visitando nossa casa (eu moro com minha vó). Então eu cresci achando que avôs visitavam avós, que essa era a relação padrão para avôs e avós.
Daí eu cresci e descobri que não era assim. Na verdade só descobri quando eu tinha 13 anos e o divórcio finalmente saiu. Mas não fez diferença porque ele continou nos visitando.
Foi só em 2006 que, por uma birrinha, eles pararam de se falar e meu avô, dramaticamente, cortou relações com a maioria da família, nunca mais pisou aqui e pediu para que no velório dele, nenhum de nós, sua antiga família, comparecesse.

Depois de um tempo, não lembro bem porque, alguém em casa teve a feliz idéia de falar 'ah, o vovô é tão sozinho, coitado, deve sentir nossa falta, porque não conversamos com ele'.
Ah, 'mas que infeliz ideia!' digo eu.

De todas as pessoas do mundo ele é a que consegue me deixar mais desconfortável. Eu nunca sei o que falar, porque eu sei bem que tudo que eu falar vai ser criticado depois.
Antes, quando eu o via adotava um tom irônico, daí ele falou pra minha mãe não me levar mais lá porque eu só sabia fazer piadinha. Depois ele descobriu que eu sou vegetariana e me informou que isso é um atraso de vida, coisa de hippie. Depois eu adotei um tom mais acadêmico, daí ele falou que eu era muito ideológica.
E hoje eu fui visitá-lo. Até tirei minha camiseta do Che Guevara. Sentei na cadeira na frente dele e ouvi ele contar a mesma história que contou nas últimas duas vezes que eu fui. Ele fala sobre os colegas de ginásio dele que também vieram pra São Paulo fazer faculdade. Sempre com um tom satírico. Um ele diz que perdeu a vida atrás de um diploma de curso superior pra escrever um livreco que nao serve pra nada e acabar com parkinson. O outro é um destrambelhado marxista que fez de tudo pra ir pra União Soviética, que aliás é outro atraso de vida, e no fim não conseguiu.
Ele fala dos dois, sempre, me mostra os livros, me mostra a estante de madeira no fundo da casa. Nunca fala sobre ele, nunca pergunta sobre mim. Me oferece refresco de açaí, vencido em 2007. Eu vou embora.

Saco cheio. Ele diz que tem pena de todo mundo que vive, que ninguém merece viver nesse mundo, que é um mato sem cão.
Eu digo, quem não tem cão caça com gato! caralho.
(Diria, quero dizer, já que não posso mais ser irônica na frente dele.)

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Sobre passar vontade

Eu tenho alguns planos. Eles se intitulam Plano A, Plano B, Plano C, Plano D. Variando de viabilidade (de A a D) e diversão (de D a A).
O Plano D consiste em: um dia, conhecer uma banda muito, muito boa, pela qual eu derretidamente me apaixonarei. nesta banda haverá um carinha muito boa gente e muito bonitinho, tudo que eu sempre sonhei, pelo qual, obviamente, também derretidamente me apaixonarei. eu, o carinha e sua banda viajaremos pelo brasil e pelo mundo conquistando seguidores para o maravilhoso som que eles fazem. no plano também estão inclusos viagens num onibus mal-cheiroso, noitadas de loucura, hoteis mulambentos, todos cantando tiny dancer do elton john, igual em quase fomosos e tudo mais.
O Plano A é, o bom e velho, acabar a faculdade com honras ao mérito, mudar pra brasília e conseguir um emprego num ministério, preferencialmente da cultura, onde poderei fazer projetos q ajudem bandas como a daquele carinha.
Obrigatoriamente, em qualquer dos planos será realizada a lista de coisas que não posso fazer deixar de fazer nessa vida, como subir a torre eiffel, dar um mosh, terminar de ler a biografia do che guevara e relar numa pessoa morta.

E hoje, nem eu tive coragem de subir na mesinha que colocaram ao lado do palco e pular, nem o carinha olhou pra mim. E eu, mais uma vez, acabei a noite fritando batatas.

www.myspace.com/thesaladmaker
o melhor show do ano, melhor inclusive que o dificilimo e trabalhoso show do cidadão instigado.

sábado, 23 de janeiro de 2010

Filho da puta

Eu canso de dizer e ninguém segue o conselho: Quando for quebrar meu coração é melhor que seja sincero.
Mesmo que a verdade não seja contada, eu vou sofrer.
E quando suspeitar da verdade, vou sofrer de novo.
E quando alguém me contar que é verdade, vou sofrer de novo.
E quando, você, filho da puta,
vier me contar a verdade, mesmo que seja cinco anos depois, vou sofrer de novo.
Filho da puta.
E o pior é que nessa situação, quando vier, finalmente, me contar a verdade, eu ainda vou ter que cuidar de você, bêbado, coisa que eu não faço por qualquer um.
Filho da puta.
Quando eu digo que verdade poupa sofrimento, acreditem, por favor.

"Não adianta chorar...
Você já fui tudo que eu quis. Eu ao seu lado já fui feliz.
Aqui se paga o que aqui se fez. Como um salário no fim do mês."
Ana Cañas

obs: a combinação de três pratos de nhoque com uma garrafa de conhaque, não funciona.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Gregório

Daí o Gregório estava sentado do meu lado na cama, estavamos brincando de colheita feliz, aparentemente, a atividade favorita dele.
Então ele disse 'Iris, nós vamos [sim, ele conjuga corretamente os verbos na primeira pessoa do plural] passar o dia inteiro juntinhos, sem fazer nada, só vamos parar pra ir pra praia, né?'
Eu, que estava roubando beringelas da colheita de alguém parei pra dizer, 'Ah, Gregorinho, não vai dar, eu ainda tenho trabalhos pra entregar'. E ele retrucou, 'Mas é férias!', mostrando as palmas das mãos, levantando a sombrancelha e com aquela voz de quem está dizendo uma coisa muito óbvia.
Eu dei um abraço nele e falei, 'Brinca mais um pouquinho, mas daqui a pouco eu vou estudar e você vai lá pra sala'.
Ele, que realmente acha que pode [e pode] convencer qualquer um de qualquer coisa, alegou que me ajudaria a estudar. Eu falei que precisava me concentrar pra escrever e com ele aqui só ficaria concentrada nele.
Foi quando ele teve um pitizinho, frequente em crianças de 3 anos que embirram, chamam os adultos de chatos e saem batendo o pé. Mas ele não.
Ele levantou, colocou a mão na cintura e disse. 'você acha que me engana? eu vou pra sair daqui e só volto quando você arrumar toda essa bagunça.' Apontou o dedo na minha cara, como se fosse minha mãe! Bateu a porta quando saiu.

Eu achei super engraçado. Mas não tem a menor graça.

Depois de um tempo ele voltou abriu a porta devagarzinho e perguntou 'você já arrumou tudo? a gente já pode brincar?'


Sabe, ele é fascinante. Eu podia passar dias só ouvindo ele contar historinha, cantar as musicas que ele inventa, pedir as comidas que ele descreve insanamente, vendo ele dançar no meu quarto com as músicas que eu ponho e ele diz que gosta. Depois ele sai cantando pela casa. Ontem estava jantando e cantou 'vai ter muito sucrilhos com champanhe e a gente vai se divertir pra caramba!'
Ai ai. Sou apaixonada por ele como ele é apaixonado por papai noel.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

O Sono e A Insônia

Os dois estão me levando a loucura.
Um me puxa de um lado, a outra me puxa do outro.
E eles se confundem numa mistura alucinante que me faz dormir 22h num dia e 6h numa semana.
Me declaro absolutamente incapaz de dormir oito horas por dia, muito menos durante a noite.
AAAAhhhhh

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Uma pá de gente

Amanda e Artur

Amanda e Artur foram passear, viver como nos bons tempos. Entupidos de vódega e refri, dançavam insanamente ao som de Bow Wow Wow. Num momento se afastaram do grupo e deitaram no chão malcheiroso (testemunha de um assassinato, provavelmente). A música continuava tocando, as estrelas brilhando e tudo girando.
Um estranho que diz ter o nome impronunciável os aborda dizendo coisas que acredita serem de profunda sabedoria. Depois de um tempo ouvindo baboseira, quando seus cotovelos já estavam doendo de ficarem apoiados no chão pedregulhoso, Amanda diz: 'eu não acredito em nada que diz, e mesmo se acreditasse, amanhã não vou lembrar'.
Conversa fiada, faca afiada, fuga desenfreada.
Amanda distraiu o louco, Otávio escondeu a faca do louco, Sofia se assustou com o louco e Artur nem percebeu nada, estava bebado demais.

Amanda

Era tarde, bem tarde da noite quando Amanda voltava pra casa ouvindo Björk. Ela não estava sozinha, mas agia como se estivesse. Amanda estava meio perturbada, não pela bebida, nem pela música, nem pela companhia. Mas estava perturbada, como se precisasse muito fazer alguma coisa e não soubesse o que fazer.
Amanda tirou o sapato de tecido rasgado do lado e começou a correr. Corria não pra fugir do passado, mas pra chegar logo no futuro. Cansada do presente, ela corria, e não parou de correr até encontrar um novo amigo.

Otávio

Enquanto Amanda ia por um caminho, Otávio ia pelo outro. Otávio também buscava o futuro, mas tinha um enorme rotivailer em seu encalço. Não poderia correr nem se quisesse. E ele queria. Forçado a continuar andando calmamente, como se não se sentisse incomodado ou amedrontado com o animal que o perseguia, Otávio foi seguindo seu caminho, até encontrar o seu destino e fechar a porta na cara do que o perseguia.

Artur e Sofia

Artur seguia Amanda, ao lado de Sofia. Enquanto Amanda girava perturbada olhando o céu e apertando o passo, Artur e Sofia conversavam animadamente, como se tivessem a vida inteira pela frente e todo o tempo que quisessem até chegar a qualquer lugar, não importando qual fosse desde que tivessem comida e onde encostar a cabeça.

Lázaro

Enquanto todos caminhavam, tentando chegar a algum lugar ou fugir de algum lugar, Lázaro serenamente aproveitava a madrugada para fazer desenhos com canetinha colorida em seu caderno de anotações sombrias. O telefone tocou. Lázaro atendeu 'alô'. Respiração ofegante do outro lado. 'Alô', ele repetiu. Entre a respiração sofrida Amanda respondeu 'Sou eu'. 'Que foi?' ele perguntou preocupado. 'Eu não sei o que fazer, preciso da sua ajuda, vem me encontar?' 'Onde você tá?' 'Tô na frente da sua casa.'

Amanda e Lázaro