terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Qualquer besteira que me ajude a (ou atrapalhe) dormir

Daí eu folhei os dez dias que faltavam pra acabar a agenda, sentindo o cheiro do alcool do marcador que marcava palavras resignadas no papel.
O livro fechado do lado, marcador de páginas dividindo o livro entre ele inteiro e o último capítulo. Não gosto de acabar livro, fica sensação de vazio, de que quando acabar acaba a história, acaba a tensão, aflição, apego e comoção que ele carregou no resto inteiro.
Mas não era isso que eu queria dizer, nem eram as besteiras que coloquei dispersas na folha de fichário que usava no colégio, enquanto me recusava a ligar computador, ver hora, voltar pra vida real.
Nem sei o que era. Se soubesse acho que me sussurava baixinho depois de acabar o livro, apagar a luz; antes de dormir. Mas não sabendo o que dizer pra mim mesma, pra me confortar, comecei a escrever qualquer coisa que pudesse me dizer. Não sei o que dizer pra me fazer dormir.
Não me vou ler uma historinha, não vou ficar mexendo no cabelo esperando o sono vir, não vou cantarolar qualquer canção que me faça alegre (alegre não, que também é exagero, alegrinha). Não vou me fazer dormir, não preciso disso.
Mas você acordada também é um porre né Iris, dorme logo e cala a boca, por favor.
Mas já tá cedo, já é claro. Que merda Iris, não podia inventar pra você mesma que sono é sagrado, que insônia não é saudável, que começar livro as 4 da manhã não dá certo, que luz acesa a noite inteira e corpo inerte o dia inteiro não pode fazer nada bem.
Não, não podia.
Não consigo dormir, Iris, que que eu faço?

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Princesa (de cantada de caminhoneiro mesmo)

Este texto é um elogio. E dialoga com este do Pedro, e este meu.

Lá pelas tantas desse ano, não sei se começo ou meio, meados então, a Fergo, empresa que fazia o transporte da minha casa para a minha casa perdeu a concessão da linha. Não sei detalhes, só boatos. Mas o fato é que não é mais a Fergo que me transporta, é a Princesa.
Desde então venho testemunhando várias diferenças. Nunca vi um motorista da Princesa ser xingado por um passageiro, tratado com impaciência pelo moço do guichê, ou proferir as frases "por favor, não reclame comigo, a culpa não é minha" ou "meu salário está atrasado". Nunca entrei num ônibus vomitado ou deparei com uma baratinha perambulando entre as poltronas. Nunca testemunhei atrasos, defeitos que impossibilitassem a continuação do percurso ou falhas na condução. Entre os outros passageiros, sequer ouvi uma só reclamação.
Todos esses detalhes que parecem básicos e óbvios para quem já esperou pelo ônibus lendo no verso da passagem os direitos do passageiro, na Fergo não eram. Não mesmo.

Então hoje aconteceu o motivo do meu elogio.
Na parada em Echaporã, tenho a impressão de que todos habitantes quiseram embarcar no mesmo ônibus. Se não foram todos pelo menos metade. E se não foi metade foi muita gente. Tanta gente que já não dava pra enxergar pelas janelas.
A primeira surpresa foi quando na segunda parada depois da rodoviária, o motorista parou no ponto em frente ao posto e disse a quem esperava. "Perdão, mas eu não tenho condições de deixar vocês subirem no ônibus. Já tem gente demais."
Digo, foi surpreendente pra quem já viu tanta gente dentro de um Fergo que desconhecidos já estavam sentando um no colo do outro, pra quem já ouviu mais de 30 pessoas sugerindo, vamos descer e empurrar, na tentativa de transpor os aclives.

A surpresa maior, emocionante mesmo, foi quando depois de alguns quilômetros rodados (2 páginas do meu livro, pra ser mais inexata) o motorista encostou o ônibus no acostamento e anunciou: "Quem está de pé pode descer e esperar um pouco que outro carro já está vindo"

Pasmem, minha nova empresa de ônibus respeita os indivíduos.